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sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

MINHA AVÓ PATERNA

ENSAIOS

MINHA AVÓ PATERNA
Minha avó tinha uma energia que se juntasse todos de casa não chegaríamos nem ao pé dela.
Se houvesse algo para fazer hoje com certeza ela já havia feito ontem.
Acho que isso incomodava muito a minha mãe. Como uma nora consegue alcançar essa perfeição. Apesar de que meu pai não demonstrava gostar ou desgostar. Acho que ele nem dava bola para o que as duas faziam que era com certeza competir. Quem ganhava? Nenhuma das duas, ou melhor, chegava uma hora que ele se cansava e dava uns berrões, que tudo chegava a tremer... Acho que aquilo até me fazia rir. Muito disfarçadamente, porque se risse descaradamente acho que minha mãe me trucidava viva.
Minha avó era realmente elétrica, até a mim que acabava acompanhando sempre ela nos lugares que ia, ela as vezes me cansava. Ela falava sem parar... sem parar... e sem parar... Então eu acabava me desligando e vendo as imagens que iam se passando do lado de fora da janela do carro. Não, ela não guiava se fosse guiar com certeza ela iria passar por cima de mais ou menos umas trinta pessoas por dia, daí a coisa ia ficar desastrosa.
Eu ia com ela para a Cruzada Pró Infância e para o Taboão da Serra. Ela entrava metralhando com o saltinho que usava. Há distancia já sabiam que ela estava chegando... Toc toc toc toc toc toc toc toc toc sem parar e muito rápido. Mas muito rápido mesmo. Toctoctoctoctoctoctopctoc... Sem respirar... Assim que era...
Ela tinha as unhas vermelhas sempre muito bem feitas. Não me lembro de vê-la com o esmalte borrado, lascado ou a unha sem esmalte. As unhas eram grandes, mas não compridas, ali pareciam que eram compridas, ali pareciam que eram o sangue que corria tão depressa que precisavam sair pelos dedos a fora, dar uma volta, pegar um ar e voltar para dentro do corpo.
Suas mãos tinham as veias saltadas para fora (acho que também precisavam respirar...) e eu gostava de ficar tentando pega-las com meus dedos... Ela falava tanto que talvez nem percebesse, não sei... Um dia perguntei por que as veias dela saltavam pela mão. Mas ela não soube me responder, ficou quieta por uns instantes, olhando para as mãos e depois para mim e depois fez um muxoxo qualquer com a boca e continuou a falar. Meu pai quis dar uma explicação qualquer, mas nem teve chance, porque ela engatou de novo no assunto que ela falava e tudo voltou a ser como era. E eu continuei ali a mexer nas suas veias.
Acho que ela era a Srª Furacão.
Não havia o que ela quisesse fazer que ela não conseguisse. Podia ser um turbante da moda ou um bolo diferente. Um nhoque, que por sinal o dela era divino, como também era o bolo de castanhas portuguesas que ela fazia. Este vinha da casa dela já dentro do pirex com tampa própria e gelado, por que ficava muito bom assim de um dia para o outro e guardado dentro da geladeira.
Um dia fui com ela numa homenagem que fizeram na Cruzada. Ela foi homenageada. Foi com uma flor enorme presa ao ombro, mas feliz da vida. Tenho foto deste dia.
Teve o dia que fui também à estação da Luz com ela. Ela estava com o uniforme que era uma roupa típica da época áurea do centro da cidade. Tinha um avental sobre uma saia listada, clara, a blusa era com mangas bufantes. Se não me engano tinha um chapeuzinho na cabeça. Não sei direito, era algo no cabelo, não me lembro bem. Apesar de estar sempre no hospital com ela, eu não tinha a roupa por que eu não fazia parte das voluntárias. Foi assim que ela me explicou, naquele momento ela não quis me magoar, penso eu. E me pôs sentada dentro da barraca com ela. Acho que era o máximo da importância estar dentro da barraca. E eu me senti mesmo importante, fazendo parte daquele grupo. Depois demos uma volta pela praça e ela me apresentou a algumas pessoas.
Um dia ela me matriculou num curso de primeiros socorros que foi ministrado dentro do hospital por uma enfermeira. Havia várias pessoas matriculadas, eram mulheres, tinha uma que era moça, um pouco mais velha que eu, mas já era casada, bonita, altiva, ia sempre com uns sapatos com um ligeiro saltinho e podia se ver que eram sapatos caros. Não que eu não pudesse ou não tivesse sapatos caros, sempre comprei os sapatos que quis isso meu pai sempre nos deu. Mas os sapatos desta moça eram mágicos. Mostravam que ela era organizada, contida, rica e quase arrogante. Fiquei amiga de curso dela. Mas só. Ela me olhava por cima dos ombros, não para me esnobar, mas pela classe de princesa que tinha. Uma princesa não olha para seus súditos de igual para igual. Pois então, ela não podia me olhar displicentemente, era por cima dos ombros. Ela era simpática, mas, era uma princesa e princesas não se misturam.
O curso foi ótimo, adorei. Aprendi que quando a gente se machuca devemos lavar os cortes com água e sabão! É isso mesmo, sabão de soda de preferência. Sabão que limpa mesmo. Se precisar com uma escovinha para tirar todo tipo de sujeira. Aquilo achei o Máximo! Limpa que limpa! Aprendemos como segurar as crianças novinhas, como trocar, como as enfermeiras dos berçários faz para cuidar dos nenês, como dar banho em bebe, como trocar as fraldas. Até como dar injeção, depois que treinamos nas laranjas, enchemos as injeções com água sei lá como chama e aplicamos umas nas outras. Essa parte não gostei nem um pouco. Tenho horror de tomar injeção até hoje. Não de tirar sangue, mas de tomar injeção. Pensei que fosse dar a minha injeção na minha amiga princesa, mas não uma fulana meio abrutalhada que me deu a injeção e eu dei nesta abrutalhada.
Tudo isso foi por causa da minha avó.
Os sacolejos na perua Combi, que nos levava para o Centro odontológico que minha avó foi designada para implantar no Taboão da Serra, eram até engraçados. Ela ia sentada na frente junto com o motorista e falando durante o caminho todo. E eu ia no banco de trás pulando com os solavancos. Na estrada para Taboão ainda não tinha asfalto. O Centro era uma casa pequena e simples que aos poucos ia tomando jeito de clínica. Tudo, absolutamente tudo tinha que ser perfeito, limpíssimo e ai se não tivesse. Ela chegava fazendo uma inspeção completa. Acho que se pudesse ela mandava todos abrirem a boca para ver se estavam com os dentes escovados e se as roupas estavam limpas. Bom, isso acha que ela olhava sim.
As vezes ela viajava para Assis conosco. Assis era a casa da minha outra avó, que era o verdadeiro oposta a ela. E teve uma vez que ela dormiu no mesmo quarto que eu, minha irmã e minhas primas. Bom, ela dormiu, mas nós não dormimos. Ela roncava tanto e tão alto. Era como uma serra. Fazíamos barulhinhos para ver se ela mudava de posição e parava de roncar, mas nada acontecia. Aconteceu foi que ela acordou e ficou brava conosco: Quietinhas! Quietinhas! No dia seguinte ela disse que não pode dormir de tanto barulho que fizemos a noite toda.
Ela adorava uma cartomante ou um guia espiritual. Então íamos para a casa da Dª Georgina sempre. Ela ia se consultar e nós éramos benzidas. Nos dias de São Cosme e Damião íamos ganhar docinhos na casa de Dª Georgina, ela fazia uma festa e distribuía doces para todas as crianças da rua.
Minha avó conheceu a Dª Georgina quando ela foi assaltada e roubaram todas as jóias dela. Alguém falou que tinha uma senhora que podia ver onde estavam as jóias. Bom, minha avó que nunca deixou para depois foi imediatamente atrás da tal da senhora. Ela fez a previsão, minha avó recuperou as jóias e nunca mais deixou de se consultar. Acho que ela não soltava um ‘pum’ sem consultar a coitada.
Mas na verdade a Dª Georgina era uma mulher negra, marrom, baixinha, mais baixa que eu que ainda era criança, quadradinha, gordinha e deliciosamente agradável e amável. Uma verdadeira florzinha raríssima da natureza. Uma paz enorme ir lá.
Tem muitas histórias dessa avó elétrica, as vezes atormentada... Atrapalhada nas confusões que se metia com minha mãe... Mas devo confessar que ela tinha qualidades únicas e até hoje sinto vontade de comer o nhoque e o bolo de castanhas que ela fazia.
Sinto saudades de vê-la brincar conosco enquanto costurava. Ela imitava com os dedos da mão direita uma tesoura cortando e com a mão esquerda ela arranhava a unha na madeira da mesa, do lado de baixo do tampo da mesa, aquilo fazia um barulho que parecia que a mão direita estava cortando como uma tesoura mesmo.
Ah! Faltou Fluoxetina para minha família.
Hahahaha...


Marisa Ribeiro Gioielli
21/01/2010.

domingo, 3 de janeiro de 2010

A Família Sabiá foi ao restaurante

AFAMÍLIA SABIÁ VAI AO RESTAURANTE

Ontem estava sentada na mesa de um restaurante.
Minha mesa era bem na janela, por onde via quem entrava e quem saia.
Estava distraída conversando... Quando... vi uma cena inusitada!
Vinha pela calçada sob minha janela, a Família Sabiá! Pai, mãe e filhote. O filho era loirinho, uma belezinha. Penugem ainda fofinha. Ele era alegre. Mamãe era atenta, olhava como quem não quer nada, mas vê tudo ao seu redor. Papai fazia cara de sério tentando impor respeito aqueles que estavam no restaurante.
Entrou primeiro papai, em seguida a mamãe e seu filhinho.
Deram uma volta por toda a área externa do restaurante como se procurassem uma boa mesa para sentar.
Após algum tempo que estavam no restaurante os vi saindo, até então não os tinha mais visto.
Desceu a escada, papai na frente, mamãe em seguida e por último o pimpolho com seu cabelinho de penugem loira.
Papai deu uma olhada rápida para mim que estava na janela. Mamãe também. Como se falassem, já estamos indo embora.
O filhinho não olhou para a janela saiu saltitando pela calçada...
Ainda vi quando papai Sabiá coçou o queixo vagarosamente, mamãe cochichou algo a ele e com passos calmos, porém firmes foram embora.
Fiquei ali sentada por um instante pensando que acabara de ver a Família Sabiá passar por mim... Voltei a atenção para o assunto que estava sendo falado na mesa, respondi algo, e acabei voltando para aquele barulho enorme que fazia no restaurante... bem diferente da ilha de calma da Família Sabiá.